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Considerações na interpretação dos testes laboratoriais da função tireoidiana

GENERALIDADES

Os testes laboratoriais para avaliação da função tireoidiana são fundamentais no diagnóstico clínico das disfunções da tireóide, pois os sinais e sintomas relacionados com estas disfunções são, muitas vezes, discretos e inespecíficos.

Este Tópico revisa, com base nas recomendações do último consenso para o diagnóstico e monitoramento de doenças da tireóide (vide Leitura Sugerida 1), alguns aspectos importantes na interpretação destes testes.
 
DISFUNÇÃO SUB-CLÍNICA DA TIREÓIDE E VARIAÇÃO BIOLÓGICA

Disfunções sub-clínicas da tireóide são alterações assintomáticas da função tireoidiana caracterizadas por TSH (hormônio tireoestimulante) elevado ou diminuído com valores de triiodotironina (T3) e tiroxina (T4) dentro dos intervalos de referência laboratorial. O tratamento destas disfunções ainda é controverso e deve ser analisado de forma individualizada.

A alta variabilidade intra-individual da função tireoidiana origina intervalos de referência laboratorial insensíveis a discretas variações que podem ser significativas para um dado indivíduo. Assim, intervalos de referência populacionais podem ser de valor limitado na interpretação dos resultados se as variações intra-individuais forem menores do que as inter-individuais. Em conseqüência, resultados anormais para um indivíduo podem estar dentro do intervalo de referência para a população (e vice-versa). Os valores de referência individuais para T3 e T4 têm geralmente a metade da amplitude da variação dos intervalos de referência populacionais.

A alta variação do TSH reflete primariamente a sua curta meia-vida (60 minutos) e sua variação circadiana é de cerca de duas vezes em 24 horas.

Estudos de variabilidade analítica permitem determinar as diferenças consideradas clinicamente significativas no monitoramento da resposta de um mesmo paciente à terapia.

Para um mesmo paciente considera-se significativas as diferenças de:

• T4 total = 1,0 µg/dL
• T4 livre = 0,5 ng/mL
• T3 Total = 40 ng/dL
• TSH = 0,7 µU/mL

DISCORDÂNCIAS ENTRE TSH E T4

Valores séricos de TSH alterados e T4 (total e/ou livre) normais são comuns e geralmente indicam hipo ou hipertireoidismo sub-clínicos quando a adenohipófise é normal e a condição da tireóide é estável. Além do hipotireoidismo sub-clínico, são causas de TSH elevado e T4 normal:

• Doses insuficientes (dose baixa ou não-aderência ao tratamento) de L-tiroxina;
• Uso de lítio, amiodarona e iodo;
• Dosagem precoce de TSH (menos de três meses após início da reposição de T4);
• Tumor produtor de TSH;
• Resistência a hormônios tireoidianos;
• Reposição de T4 na gravidez;
• Presença de anticorpos heterófilos.

Resultados de TSH normal e T4 livre alterado usualmente indicam uma interferência na determinação de T4 livre, freqüentemente secundária a uma anormalidade com as proteínas carreadoras de T4.


PROTEÍNAS CARREADORAS E HORMÔNIOS TIREOIDIANOS

Os hormônios T3 e T4 circulam primariamente ligados a proteínas carreadoras, tais como TBG (Thyroxin binding globulin, principal proteína carreadora), albumina e pré-albumina. Ligados a estas proteínas, os hormônios tireoidianos são metabolicamente inativos; portanto, a fração livre (não-ligada) expressa a fração biologicamente ativa. Certas medicações, hormônios como os estrógenos, outras doenças não-tireoidianas e problemas hepáticos podem causar alterações na concentração das proteínas carreadoras, comprometendo a confiabilidade das determinações de T3 e T4 totais. A TBG está aumentada na gravidez, no uso de estrógenos, na hepatite aguda e por fatores congênitos, e diminuída na síndrome nefrótica, no uso de andrógenos e corticóides, na cirrose hepática, desnutrição ou de forma congênita.

 

SUB-ESTIMAÇÃO DE T4 LIVRE SÉRICO POR IMUNOENSAIOS

Teoricamente, a dosagem de T4 livre é útil em situações onde níveis anormais de TBG e/ou albumina se traduzem em níveis anormais de T4 total. Entretanto, os imunoensaios utilizados para determinação de T4 livre freqüentemente subestimam as concentrações séricas de T4 livre. Métodos para dosagem de hormônios livres que não aplicam a separação física das frações ligada e livre, amplamente utilizados pelos laboratórios, são dependentes de proteínas carreadoras e devem ser considerados como uma estimativa do hormônio livre. Os métodos que medem T4 livre com maior exatidão são os de Diálise de Equilíbrio e Ultra-Filtração. Estes métodos não estão disponíveis na rotina dos laboratórios clínicos.


IDADE

As concentrações de TSH e T4 livre são mais elevadas em crianças (especialmente na primeira semana de vida e durante o primeiro ano) do que em adultos normais. Os níveis de TSH e T4 livre em crianças se eqüivalem aos de adultos a partir dos cinco anos de idade para o TSH e a partir de dez semanas para o T4 livre.


GRAVIDEZ

Durante a gravidez, o excesso de estrógeno aumenta progressivamente as concentrações médias de TBG (duas a três vezes os níveis pré-gestacionais até a 20ª semana de gravidez). Esse aumento resulta em uma elevação nos níveis de T3 e T4 totais em cerca de 1,5 vezes os níveis não-gestacionais até a 16ª semana de gravidez e provocam a queda nos níveis séricos de TSH durante o primeiro trimestre de gravidez. Níveis séricos de TSH diminuídos podem ser encontrados em aproximadamente 20% das gestações normais.

 

INTERFERÊNCIA NOS TESTES TIREOIDIANOS

Medicamentos

Alguns medicamentos podem interferir nos resultados dos testes da tireóide:

• Interferências in vivo:

estrógenos, glicocorticóides, propranolol, iodo, amiodarona, dopamina, lítio, metoclopramida e propiltiuracil.

• Interferências in vitro:

fenitoína, carbamazepina, diazepam, furosemida e heparina.

 

Anticorpos Heterófilos

A presença de anticorpos heterófilos, raramente encontrados no soro do paciente, podem ocasionar valores falsamente aumentados ou diminuídos. Alguns destes anticorpos podem atravessar a placenta e interferir nos resultados de triagem neonatal para perfil tireoidiano. As metodologias mais recentes disponibilizam combinações de anticorpos e agentes bloqueadores para neutralizar os efeitos destes anticorpos nos imunoensaios.
 

Anticorpos Anti-Tireoidianos

Auto-anticorpos anti-T3 e/ou anti-T4, mais freqüentes em indivíduos com doenças auto-imunes da tireóide, raramente interferem na dosagem dos hormônios tireoidianos. Porém, não devem ser descartados. A importância clínica da presença de auto-anticorpos anti-hormônios tireoidianos está no possível erro diagnóstico da tireotoxicose, e na implantação de tratamentos desnecessários. A presença de anticorpos anti-T3 é a mais comum e está estimada em 1:1000 das dosagens de T3 totais.
 

CONCLUSÃO

A correlação entre os resultados fornecidos pelo laboratório e os dados clínicos do paciente é fundamental no diagnóstico e monitoramento das disfunções tiroideanas.


Seleção de Artigo:
Dr. Ricardo Florian Mottin CRF 5.817
Laboratório Mottin
Contato pelo site: www.laboratoriomottin.com.br
ou pela Central de Atendimento: (51) 3632-1224

LEITURAS SUGERIDAS
1) NATIONAL ACADEMY OF CLINICAL BICHEMISTRY. Laboratory medicine practice guidelines - laboratory support for the diagnosis and monitoring of thyroid disease. p.5-32, 2002.
2) NELSON, J.C. et al. Variable underserestimates by serum free thyroxine (T4) immunoassays of free T4 concentrations in simple. In: JCE&M. 79(5):1373-1375, 1994.
3) STIG, A. et al. Narrow individual variations in serum T4 and T3 in normal subjects: a clue to the understanding of subclinical thyroid disease. In: ________. 87(3): 1068-1072, 2002.